Estudo publicado na última segunda-feira (11) pelo Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) usou nova metodologia estatística, a partir dos registros de óbitos
Pesquisa divulgada nesta segunda-feira (11) pelo Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) revela que o coronavírus já circulava no Brasil antes do que se imaginava. Enquanto a data oficial do primeiro caso é de 26 de fevereiro, na cidade de São Paulo, o estudo aponta que a primeira morte por Covid-19 se deu no Rio de Janeiro entre 19 e 25 de janeiro.
Este estudo utiliza uma metodologia estatística a partir dos registros de óbitos, que indicam que a transmissão comunitária da doença no Brasil já estava em curso no início de fevereiro, ou seja, mais de 20 dias antes do primeiro caso ser diagnosticado em um viajante que retornou da Itália para São Paulo e quase 40 dias antes das primeiras confirmações oficiais de transmissão comunitária, em 13 de março.
Os autores da pesquisa destacam que, em todos os países analisados, a circulação da Covid-19 começou antes que fossem implementadas medidas de controle, como restrição de viagens aéreas e distanciamento social.
“Esse período bastante longo de transmissão comunitária oculta chama a atenção para o grande desafio de rastrear a disseminação do novo coronavírus e indica que as medidas de controle devem ser adotadas, pelo menos, assim que os primeiros casos importados forem detectados em uma nova região geográfica”, afirma o pesquisador do Laboratório de Aids e Imunologia Molecular do IOC/Fiocruz, Gonzalo Bello, coordenador da pesquisa.
Apesar de vários países terem o início da transmissão comunitária em momentos muito próximos, a expansão da epidemia em cada localidade parece ter seguido uma dinâmica própria. “Muito provavelmente, a dinâmica de expansão da epidemia foi definida por fatores locais, como características ambientais de temperatura, precipitação e poluição do ar, densidade e demografia da população”, acrescenta o pesquisador do Instituto Gonçalo Moniz (Fiocruz-Bahia), Tiago Graf.
Além de ajudar a esclarecer o início de transmissão local do SARS-CoV-2 nos países estudados, os autores destacam que os resultados obtidos reforçam a importância da implementação de ações permanentes de vigilância molecular, uma vez que o novo coronavírus pode voltar a circular e causar surtos ao longo dos próximos anos. “A intensa vigilância virológica é essencial para detectar precocemente a possível reemergência do vírus, informando os sistemas de rastreamento de contatos e fornecendo evidências para realizar as medidas de controle apropriadas”, completa Gonzalo.
O estudo foi realizado pelo Laboratório de AIDS e Imunologia Molecular do IOC/Fiocruz em parceria com Fiocruz-Bahia, Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e Universidade da República (Udelar), no Uruguai. Os resultados foram publicados na seção ‘Fast Track’ da revista científica ‘Memórias do Instituto Oswaldo Cruz’, que permite a divulgação acelerada de pesquisas relacionadas à pandemia.
No Brasil, outras evidências, obtidas a partir de metodologias diferentes, apoiam a estimativa de que a transmissão local da Covid-19 começou no início de fevereiro, coincidindo com a expansão da epidemia na América do Norte e Europa. De acordo com o InfoGripe, sistema da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) que monitora as hospitalizações de pacientes com sintomas respiratórios agudos graves (SRAG), o número de internações encontra-se acima do observado em 2019 desde meados de fevereiro de 2020.
Além disso, análises moleculares retrospectivas de amostras de SRAG detectaram um caso de infecção por SARS-CoV-2 no Brasil na quarta semana epidemiológica, entre 19 e 25 de janeiro. O aumento sustentado no número de infecções foi observado a partir da sexta semana epidemiológica, entre 2 e 8 de fevereiro, conforme apresentado no MonitoraCovid-19, sistema do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (ICIT/Fiocruz). "Esses dados epidemiológicos confirmam a introdução do SARS-CoV-2 no Brasil desde o fim de janeiro e claramente sustentam nossos resultados, que apontam que o vírus estava circulando na população brasileira desde o início de fevereiro", pontua Gonzalo.
Estado de Minas
Foto: Tiago Queiroz/ESTADÃO CONTEÚDO