Especialistas identificaram que pessoas com tipo A correm risco maior de desenvolver sintomas mais intensos da doença.
Pelo menos dois estudos apontam uma possível relação entre o tipo sanguíneo e a infecção ou a gravidade do quadro de pacientes com a Covid-19. Um dos estudos é chinês e foi divulgado somente em uma plataforma de pré-impressão de estudos de saúde. Em junho, pesquisadores europeus publicaram no New England Journal of Medicine os resultados do estudo que indicava que pessoas com tipo A correm risco maior de desenvolver sintomas mais intensos quando infectadas pelo coronavírus. No estudo, foram analisadas 4 mil pessoas e os pesquisadores apontam que a análise de associação genômica permitiu a identificação de possíveis fatores genéticos envolvidos no desenvolvimento da doença.
“São os dois estudos com maior número de participantes, 4 mil no europeu e cerca de 2 mil no chinês e eles têm resultado muito similares, que nos deixam um pouco mais convencidos de que realmente exista alguma suscetibilidade”, afirma o chefe do Serviço de Hemoterapia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Leo Sekine. Segundo ele, no estudo chinês, conehcido em março, os pesquisadores teriam percebido que na população de infectados havia uma proporção superior de pessoas do grupo sanguíneo tipo A com a Covid-19 do que no grupo de controle de pessoas sem a doença.
“Também analisaram que tinham um percentual inferior de pessoas do grupo O, em comparação com os sadios. A conclusão foi de que aparentemente pessoas do grupo A tinham maior chance de infecção e as de grupo O, menor. Isso segue mais ou menos a mesma linha do estudo publicado no New England Journal of Medicine, onde eles acharam que há 45% a mais de chance de risco de infecção por parte dos pacientes do grupo A em relação àqueles que não eram A e, por outro lado, os que eram do grupo O, em comparação com os demais, tinham 35% de redução no risco de infecção”, explica. De acordo com Sekine, com base nos dois estudos, feitos com um número relativamente elevado de pacientes, aparentemente parece haver uma relação entre o tipo sanguíneo da pessoa e a suscetibilidade ao contágio ou à gravidade da doença.
“Talvez os grupos B e AB, que são menos representativos na população em geral, sejam um caminho intermediário entre um e outro, mas é importante não usar isso como uma desculpa, as pessoas do grupo O não são imunes, então todo cuidado é pouco”, enfatiza. Mesmo assim, Skine ressalta que existem algumas questões de suscetibilidade que possam explicar o porquê de os tipos sanguíneos demonstrarem tamanha diferença. “Existe algum tipo de mecanismo de infecção que seja viabilizado por um grupo sanguíneo em detrimento de outro, nesse contexto que a gente já tem de informações formadas sobre a infecção, sobre mecanismo de infecção e de manifestações mais graves, talvez um dos grandes pontos a favor das pessoas do grupo O seja o tipo de expressão de fatores de coagulação que esse grupo tem”, assinala.
Usualmente, conforme Sekine, essas pessoas têm uma condição, em comparação com os outros grupos, menos abundante. “Não chega a ser clinicamente importante, não sangram mais do que os outros grupos sanguíneos, mas tendem a ter uma produção menor do que os demais grupos e, como sabemos que a coagulação do sangue tem sido um mecanismo preponderante, sobretudo nas manifestações mais graves da Covid-19, talvez esse seja um dos mecanismos pelo qual haja uma suscetibilidade do grupo”, detalha.
Apesar de não haver esse tipo de explicação nos estudos, Sekine destaca que, se realmente o mecanismo da coagulação explicar essas diferenças, isso só reforça um dos conhecimentos já adquiridos com relação ao benefício do uso de anticoagulantes já num período precoce da doença, o que de uma forma geral já está sendo praticado. “É possível que exista essa relação, ambos estudos são bem robustos e acredito que seja uma hipótese bastante válida”, reitera Sekine.
No Rio Grande do Sul o tipo sanguíneo dos casos confirmados do novo coronavírus não é divulgado. Conforme a Secretaria Estadual de Saúde (SES), “esta informação não consta nas fichas de notificação”. “Seria mais uma forma de a gente conseguir, em outra população, esses mesmos dados. Com os detalhes, seria possível realizar um estudo populacional no Brasil, onde temos uma ascendência genética diferenciada”, ressalta Sekine.
Informações: Correio do Povo